domingo, 30 de agosto de 2009

esquecimento

Ele vai esquecendo que ela existe porque a vida vai levando a outras memórias e outros encontros. Ela vai esquecendo que ele existe porque a vida vai seguindo em outros trajetos, novos objetos podem chamar sua atenção. Ele vai esquecendo que ela existe porque na verdade já não se incomodava tanto com a existência dela. Ela vai esquecendo que ele existe porque não há outro jeito e é assim que tem que ser. Ele vai esquecendo que ela existe e ela adivinha que isso acontece e isso aperta-lhe o peito, angústia! Ela vai esquecendo que ele existe porque é assim que tem que ser, é assim que tem que ser. Ele vai esquecendo que ela existe pois na verdade não gostava dela tanto quanto dizia a si mesmo que gostava e ela sabia disso, ela sabia disso. Ela vai esquecendo que ele existe porque é fácil para ela esquecer que ele existe, embora existam memórias que durem pra sempre e que a acompanham há anos e ele não desconfia delas, ele nunca saberá. Ele vai esquecendo que ela existe. Ela não quer esquecer que ele existe, mas a vida está sufocando-lhe por todos os lados e o que ela mais quer é esquecer que a vida existe.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

apatia

Se Eliana soubesse o que aconteceria, ela saberia exatamente que caminho tomar. Não entendiam os deuses que ela não queria errar? E o destino, não entendia ele que ela queria achar seu trilho, sem tropeços? Ela queria dizer a todos os que assistiam sua jornada que o que ela queria era não errar e viver a vida sem fazer mal a si mesma e aos outros. Nisso ela era quase cristã. Não tinha medo de pecar, não acreditava em diabo, mas tinha fé de que o sofrimento pode matar, nisso ela acreditava piamente, então o que ela queria era viver a vida pegando os atalhos mais próximos, correndo dos vendavais, contornando becos escuros, evitando amigos desleais. Ela queria evitar a fadiga, era partidária da filosofia do carteiro Jaiminho do Chaves. E por causa de não querer errar a porta, equivocar-se na marcha, atropelar-se no afã de cumprir com os prazos e horários que a vida lhe impunha, ela acabava que não fazia nada, não cumpria prazo algum, não entrava por porta alguma, quase que cruzava os braços presa em suas reflexões que nada produziam. Mas ela não deixava de fazer as coisas por preguiça ou má vontade, ela só não queria errar, o motivo da apatia era o receio de colocar tudo a perder. Afinal, se fizesse alguma coisa, se se deixasse levar por alguma opção mal avaliada, que raios de tormentos poderiam lhe alcançar? Ela não queria errar, não entendiam os deuses esse simples desejo?