segunda-feira, 26 de outubro de 2009

os primeiros momentos da manhã

Rogério levantou-se naquele domingo às 11h34. Era exata a imagem da hora do relógio, e a imagem não se apagava, até o dia seguinte, quando olhava a hora que acordava e guardava até a hora de dormir novamente.
Rogério levantou-se às 11h34 e caminhou até a cozinha, onde olhou sem vontade a garrafa térmica de café, os pães em seus sacos plásticos e algumas migalhas sobre a mesa da cozinha.
Rogério chegou à cozinha sem vontade de estar ali ou em qualquer outra parte. Vinha sentindo um peso enorme todo dia ao dormir e ao levantar. E também naqueles momentos em que sua insônia intermitente fazia com que acordasse no meio da noite e se conscientizasse de que estava no quarto, na cama, na horizontal, no quarto, na cama, na horizontal, no quarto, na cama, na horizontal, e em nenhum outro lugar diferente do lugar em que se encontrava no quarto, na cama, na horizontal. Era o que sentia: sempre a mesma coisa no quarto horizontal e na cama, sem soluções. Estava cansado de si mesmo e sentia a vida inexpressiva. Era preciso fazer alguma coisa, ele sabia disso. E elaborava há dias, semanas, meses. Era preciso fazer alguma coisa para sair da horizontal. Sentiu saudades de uma época em que tinha vontades. Mais vontades, quaisquer que fossem.
Olhou o relógio e viu que agora eram 11h38 e o domingo ainda era domingo, assim como o começo, que não deixava de ser começo. E o desmaio que veio a seguir imprimiu uma verticalidade inescapável àquele momento.

Um comentário:

danielle schlossarek disse...

Vivian, você é demais! Adorei seu texto e sua "verticalidade inescapável". Maravilhosamente inescapável!