quinta-feira, 24 de março de 2011

trajeto

estela pensava. voltava de ônibus. mais tempo, mas mais espaço do que metrô. queria olhar as paisagens que passavam ao invés de olhar para a cara das pessoas que olhavam para suas páginas de livros, revistas, jornais, ou para as telas de seus celulares, evitando olharem para estela.

no ônibus, estela não olhava para ninguém. ou olhava para os transeuntes, que não olhariam para ela por muito tempo. olhava-os pelas costas, como as punhaladas dos covardes. olhava sem deixar que o outro notasse a autoria do seu olhar. resguardava-se daquele seu ato de olhar. e olhava para não salvar nada dentro de si e guardar longe qualquer pergunta que martelasse.

e havia uma pergunta que martelava. e um medo que ela tinha que conter. era melhor, então, olhar as ruas, fugir dos subterrâneos. era melhor tapar os olhos.

Um comentário:

danielle schlossarek disse...

Lindo texto, Vivian! Saudades das coisas que vc escreve.
"olhava sem deixar que o outro notasse a autoria do seu olhar." Quantas vezes fazemos isso, muitas vezes sem perceber.
beijos!!!